Desde que me lembro que tenho estas vizinhas aqui no prédio.
Foram jovens que viviam com os pais, depois uma casou, saiu de casa até que,
anos depois voltou com um monte de crias.
Isto seria uma história normalíssima, não fosse a mãe delas
viver num apartamento, as primas no outro, e, agora recentemente, a irmã
comprar o outro apartamento por cima e a tia o outro do lado. E, de repente,
viverem todos como se o prédio fosse apenas daquela gigante família dividida
por inúmeros apartamentos, em que o abre e fecha a porta é constante. As
crianças não param de sair de uma porta e entrar na outra. E todos os dias é
uma grande algazarra à hora do jantar, quando a gigante família se junta apenas
num dos apartamentos. Aqui parece que não há o conceito do filha casa, os pais
ficam longe!
Depois, com os vizinhos acontecem peripécias estranhas na
intercomunicação com esta gente. O tio estranho desta família, a morar aqui há
poucos meses, abre a porta de casa e mete-se, subitamente, numa conversa de
vizinhos que nada tem a ver com ele: “Eu vou ligar ao meu advogado! O senhor
está a levantar falsos testemunhos!”. E ficam os senhores da conversa a olhar
para ele com cara de parvos: “Como é?”. As crianças esquecem-se do cachorro
mini na escada, que se acha valente e impede os vizinhos de saírem, a mostrar
os dentes afiados e a ladrar incessantemente. Confesso que cheguei a ter
vontade de lhe espetar uma biqueirada por ele me estar a bloquear o caminho,
mas a minha voz de zangada a falar com o cão, fez os senhores irem ver o que se
passava e: Ups! Deixámos o cão na escada! (Bem, isto sou eu a pensar o que lhes
passou pela cabeça, porque mais do que uma vez encontrei ali o animal a ladrar
furiosamente, ou seja, não me parece que fosse esquecimento.) No outro dia, foi
um dos gatos que se escapuliu da casa e andava a vaguear pela escada. Que raios
de donos são aqueles que não reparam pelos bichos todos a sair pela porta de
casa, heim?? Enfim...
Mas, à excepção disto tudo, sempre houve uma relação cordial
entre mim e este gigantesco conjunto de vizinhos. Era “Bom dia!”, “Boa tarde!”,
etc., como mandam as regras da boa educação. Até ontem.
Saio, como de costume, aperaltada, para um jantar com
amigos, e cruzo-me com duas das personagens desta família, uma de cada apartamento,
a entrar no prédio. A única explicação que encontro é a mini-saia tamanho
S que eu usava e os saltos de dez centímetros terem causado inveja na jovem
senhora, que nunca foi esbelta e que nunca vestiu menos do que o XXL nem usa saltos. Porque
como de costume disse “Boa noite!” ao me cruzar com eles e “Obrigada!” por a
senhora ter ficado a segurar a porta quando entrou para eu sair. O tio estranho
da senhora responde-me normalmente e ela, com um olhar furioso, manda-me dois
berros: “BOA NOITE! OBRIGADA!”.
E fiquei eu a pensar: “Está a agradecer-me o quê??”
(E, não, aqui não há a hipótese de ela não me ter ouvido falar e
agradecer, que ouviu. Disso tenho a certeza.)
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